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Diário de quem já não vai para novo

...porque as palavras são a voz da alma.

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12.11.24

Vale de lágrimas


a. almeida

Há bocado, bocadinho, vi pela rede social Facebook alguém que partilhou uma fotografia de uma filha, criança, desconsolada, lavada de lágrimas, a pretexto de nada de significativo, mas tão somente porque na noite deste Domingo o seu clube perdeu com a equipa rival por 4-1.
Nada de mais e de resto vitórias sobre o mesmo clube, com igual ou maior expressão têm acontecido e nestas coisas do jogo da bola bem sabemos (excepto os fanáticos com défice de lucidez) que uma moeda tem sempre duas faces. Além do mais há o ditado que “cá se fazem, cá se pagam” ou o “tudo o que sobe, desce” e outras lições mais, incluindo a oriental do karma.

Importará, pois, fazer ver, e mesmo ensinar, e sobretudo aos mais pequeninos, que o futebol e os seus protagonistas não merecem tanto desconsolo. É apenas uma insignificância muito, muito relativa. Se pudermos ficar fora desta dependência que tolhe as emoções e a lucidez, tanto melhor.

Aos meus filhos nunca impus ou influenciei qualquer seguimento pelo clube de que sou simpatizante. Nem de pequenos, nem de grandes. Fazer-lhes isso seria condicionar a sua liberdade, tanto numa fase da idade em que não têm percepção dela, ou mesmo quando já são detentores de escrutínio e escolha própria.

Mas há, e no geral, quem teime nesta forma de moldar os gostos e as preferências dos nossos e dos outros. Assim, não raro, desde pequeninos é ve-los a vestir, aos filhos ou afilhados, camisolinhas com as cores dos clubes, chapéus, cachecois, jogos, brinquedos, levá-los aos jogos, etc. num doutrinamento que se critica a entidades, estados ou governos.

Em suma, nada justifica que uma criança chore ou se entristeça pelo seu clube, o clube que os seus determinaram que fosse. Diz isto, sem moralismos, um benfiquista que gosta do seu clube, que também tem a paixão na justa medida, mas que, no caso do jogo em questão, só soube do resultado na manhã do dia seguinte, tendo ido dormir despreocupado e com a segura certeza de que o que for há-de ser. De todos os jogos do clube até ao momento realizados, terei visto uma 10 minutos de resumos, se tanto.

Para além de tudo, o futebol profissional, aquilo é gente que vive e ganha como príncipes e que não justificam que por eles ou pela sua entidade patronal se perca uma lágrima sequer, quanto mais um vale de lágrimas a ponto de nos estragar o dia ou noite.

Há, pois, coisas bem mais importantes, muito mais, e quem não for capaz de relativizar e ordenar a ordem dos seus valores, não andará no caminho certo. Dirão que paixão é isso, que é fervor, e mais uma catrefada de lugares comuns, mas no final das contas tudo não passa de um saco de argumentos que vale zero, apenas com aquelas coisas que dizemos e ouvimos só para nos convencermos a nós próprios.

Haja bom senso e um relativismo saudável!

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