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Diário de quem já não vai para novo

...porque as palavras são a voz da alma.

Diário de quem já não vai para novo

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07.08.24

Vão dar banho ao cão


a. almeida

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A Cascata de Várzeas situa-se no rio Arado, no sítio de Fecha de Barjas, do lugar da Ermida, em Vilar da Veiga, maior freguesia do concelho de Terras de Bouro, em pleno Parque da Peneda-Gerês, sendo conhecida como cascata do Tahiti por ali, há uns bons anos, ter sido filmado um anúncio publicitária a um champô com o mesmo nome, em que uma beldade tomava um delicioso e refrescante banho sob a cascata.

De tão popular que é o local, querem agora ali construir mais um pingarelho artificial, tipo miradouro, provavelmente para os fotógrafos fazerem uns zooms sobre quem toma banho. 

A justificação dos responsáveis será a questão da segurança, já que têm sido muitos e graves os acidentes, ignorando as opiniões de quem percebe da poda, como o Rui Barbosa, montanhista e guia e profundo conhecedor do parque, que afirma que a questão de segurança não se prende com a observação da cascata mas ao nível do leito da ribeira e sobretudo na parte de cima, nos poços junto aos moinhos, por baixo da ponte. Já estive no local mas já por me parecer perigoso, não passei da ponte e do que por ali se via. Mas a maioria não resiste a arriscar-se até à cascata.

De resto, aqui há algum tempo, um proprietário esperto ali construiu um passadiço que facilitava o acesso ao sítio e que cobrava 1 euro por pessoa, com a vantagem de que de algum modo reduziu os probelmas de segurança no acesso, mas que foi removido pelas autoridades e vedado o local.

Em resumo, mesmo com várias pessoas e entidades contrárias a esse miradouro artificial, e com o assunto a ganhar destaque na imprensa, não custa a acreditar que a coisa irá mesmo ser concretizada. De resto é típico e na onda desmesurada de construção de passadiços, miradouros e baloiços que vai grassando um pouco por todo o lado, do norte ao sul e ilhas.

Especialistas que somos na atabalhoada transição do 8 para o 80, esta pretensão só surpreende quem ainda não sabe do que a casa gasta.

29.05.24

Rio de Onor - A merecer amor


a. almeida

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Num fim de semana com tempo propício a dar à sola, uma saída pelo extremo nordeste transmontano. Dos locais que merecem passagem obrigatória, uma visita a Rio de Onor, eleita em 2017 num concurso manhoso como uma das 7 maravilhas das aldeias portugueses (aldeias em áreas protegidas), situada em pleno Parque Natural de Montesinho, no concelho de Bragança, mesmo no limite da raia, e, porque à beirinha e em continuidade, também um olhar à espanhola Rhionor de Castilla e cujas populações convivem irmanadas como se fossem uma única aldeia.

Aldeia de montanha, formada de casas típicas serranas onde predominam o xisto e a madeira como materiais de construção, com varandas alpendradas a que se acedem por escadas exteriores, e ladeadas pelo límpido rio com nome de Onor, do lado português, e del Fontano, do lado espanhol, que enquadram a paisagem, marcada pela igreja matriz de S. João Baptista, sem torre mas com campanário de dois sinos, como é típico por esta região transmontana.

Ambas as margens do rio são unidas por várias passagens, como a emblemática ponte de origem romana. Do lado de Espanha, a singular travessia por poldras (conjunto de pedras alinhadas, cada uma à distância de um passo).

Dizem os guias turísticos que é uma aldeia de coração comunitário e que tem nos seus habitantes o melhor património, com genuíno saber receber.

Talvez porque com a expectativa em alta, porque quem visita Rio de Onor apenas fotografa as coisas pitorescas, floridas e bem arranjadas, sobretudo o casario à face da ruela que margina o rio pelo lado esquerdo, confesso que fiquei desapontado. Esperava uma aldeia mais homogénea na sua estrutura e sobretudo bem limpa e arranjada, já que é nitidamente um local visitado. Do lado espanhol, mesmo que também com casario em ruínas e a igreja de Santa Martina desmazelada e ressequida pelo sol, vi mais asseio e limpeza das ruelas.

Mas vi, naturalmente, do lado português coisas bonitas, mas sobretudo muitas casas em ruína, a ameaçarem cair sobre quem passa nas rua, a merecerem melhor sorte e com reconstrução condizente à tipologia de materiais e tradição, o que não vi de todo na maior parte das reconstruções, algumas autênticas aberrações. Vi algumas dessas ruínas à venda, mas acredito que com valores desfazados da realidade. O local é bonito, com algum valor turístico, mas em rigor daquelas ruínas pouco ou nada se aproveita numa reconstrução, para além do modelo e tipologia a seguir e respeitar. Ora os vendedores e imobiliárias nestas casos têm a tentação de vender um monte de pedras como se ouro seja.

Fica a ideia que por ali, apesar da natureza da aldeia e da sua integração no Parque Natural de Montesinho, cada um constrói e reconstrói como bem lhe apetece. E do que se vê reconstruído, invariavelmente relacionado ao turismo, nomeadamente com casas de alojamento. A comprovar esta falta de gosto, até a vista frontal da bonita igreja matriz é perturbada por vários grossos e negros cabos da rede eléctrica. Que raio de gente esta que manda nestas coisas, a ponto de não serem capazes de encontrar uma solução que desvie os cabos da vista?

Merecia, de facto, uma maior atenção dos responsáveis. Ainda muito falta fazer por ali, mas também, convenhamos, quem é que se preocupa com uma aldeia isolada ali na extrema de um país que pouco ou nada valoriza o seu interior e sobretudo o mais profundo?

O caminho que falta percorrer nesse sentido de valorização e requalificação ainda é longo e sinuoso como a estrada que liga a Bragança, que dizem que parte dela só a partir de década de 1960, pelo que pelo menos uns 30 quilómetros até à aldeia eram percorridos apenas por trilhos e caminhos no que acentuava o seu isolamento face a povoados próximos, sobretudo à sede do concelho.

Rio de Onor, seja como for, a merecer visita, mas sobretudo amor.

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27.05.24

Em Estevais com J. Rentes de Carvalho


a. almeida

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Sozinhos ou na companhia de bons amigos, podemos fazer, 100, 200, 500 ou mais quilómetros, ver paisagens incríveis, lugares maravilhosos, sobretudo como os de Trás-os-Montes, transpor rios cantantes, atravessar ou percorrer aldeias pitorescas, ouvir histórias de vida ou meras curiosidades locais, colher cerejas do ramo de uma generosa sardeira, saborear os melhores pratos, degustar os mais frescos vinhos, mas delas curtas ou longas, valem as que acabam por ser peregrinações, pelo lado humano e mesmo espiritual que absorvemos. Foi já assim, há tempos, com a visita a um dos meus mestres das letras, o Miguel Torga, presente espiritualmente por ali naquelas paisagens simultaneamente rudes e acolhedoras, do seu reino que pintou como “maravilhoso”, fosse pelo negrilho que povoou o seus poemas, fosse já no repouso eterno na campa simples e rasa escondida num canto do cemitério da aldeia, mas agora, com a graça de ainda andar entre nós, deu-se a conjunção de certos astros para que pudesse ter a alegria de poder ser recebido por J. Rentes de Carvalho, interrompido no trabalho e do sossego da sua casinha na remota aldeia dos Estevais, ali pelo Mogadouro, onde tem raízes profundas.

A caminho do centenário, é este um dos meus autores preferidos e partilho com ele alguma amargura de só tardiamente ser descoberto e reconhecido no nosso e seu país, apesar de já ser tanto holandês como transmontano. Mesmo no seu município, onde o simples Trindade Coelho é orgulho local, só agora, aos 94 anos de idade, vai dar o seu nome à Casa da Cultural. Não é muito mas é alguma coisa.

Foi um tiro no escuro, um tiro de sorte ou apenas uma premonição, mas certo é que a minha passagem por Estevais rendeu frutos. Como escreveu na dedicatória num dos livros por si autografados, apareci como "um padre", porque sem anunciar, mas fui recebido e vi autografados a meia dúzia de livros que levava nessa esperança e ainda com a graça acrescentada de receber outros tantos como generosa oferta. E não digo que tive o privilégio, porque ao dizê-lo olhos nos olhos, ele corrigiu-me dizendo que "os privilégios não se recebem, oferecem-se". E ele ofereceu-mo!

Obrigado J. Rentes de Carvalho. Missão cumprida. Já pode colocar o aviso no portão da casa para não ser incomodado. De facto não se incomoda um artista na hora do seu trabalho, na criação, na sua própria casa, na sua aldeia. Bem haja!

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15.05.24

Sporting, sempre!


a. almeida

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Num certo Domingo à tarde, em pleno Verão. Por cá já muitos emigrantes em merecido período de férias, a ajudar a encher as estradas, os restaurantes e as esplanadas.
Nunca fui emigrante mas percebo e compreendo que esta nossa mania portuguesa dos saudosismos leva-nos a querer encher o corpo e a alma, revendo pessoas, lugares e coisas, mal se cruze a fronteira. Ora se o Casimiro esteve três dias a banhos no Gerês e quando regressou a casa sentiu-se como estivesse ausente três anos, não surpreende que o Manel da Zira, depois de um ano longe de Guidães, logo que chegado à aldeia, mesmo antes de rever a família, passe por Espinho, para ver e sentir o mar e embriagar-se daquele ar salgado e sentir no rosto as frescas nortadas, as mesmas das idas à praia em solteiro. Já o Chico do Albertino, logo que arrumadas as trouxas vai direitinho à Tasca da Aida encostar-se ao balcão e beber o melhor "paralelo" do mundo e arredores, incluindo a Suiça. A Fernanda do Neves, essa faz questão de ir a Fátima agradecer a Nossa Senhora e aos pastorinhos. No regresso faz paragem na Mealhada, tão sagrada quanto a da Cova da Iria, e ver regalada na travessa um rosário de pedaços dourados de tenro leitão, seja no Virgílio, no Pedro, na Meta ou no Rocha (este já na estrada do Luso). Cá vai! Amém!

Ora o Zé Canadas, chegado da Suiça, nesse Domingo à tarde, encheu o carrão com a mulher e os filhos e foi de abalada até Castelo de Paiva e na Rua da Boavista, apontada à praça dominada pelo austero conde lá do sítio, entrou na tão afamada quanto concorrida Adega Sporting, lugar de antigas petiscadas e pela qual, nos domingos cinzentos entre La-Chaux-des-Fonds e Le Locle, tanto suspirou, imaginando o doce sabor acanelado das rabanadas, o picante das moelas ou o vinhadalho do bucho.

Depois de alguma espera, porque ali o espaço é pequeno para tanta fama, lá arranjou uma mesa corrida e os cinco instalaram-se. - Então, o que vai ser? Para mim quero moelas e no final uma rabanada. E para vós? Quereis uma rabanada, bucho, moelas, rojões, orelha? E tu Nandinha? Vai uma punheta de bacalhau? Gostavas delas! Não querem nada?!!! - Encolheu o beiço. - Mau...
Que nada. Nem xus-nem-bus. Nem a filharada nem a esposa, ela de calcinha branca, medrosa de se salpicar do vinhão tinto, eles estranhadiços naquele ambiente de tasca, dvam mostras pelas expressões de qualquer interesse na petiscada. O Canadas percebeu o recado de tantos narizes torcidos e logo esmoreceu. Envergonhado e rendido, pediu apenas uma rabanada e "uma malga" de verde tinto. O empregado recolheu as toalhas e os talheres dos putativos comensais. Toda aquela mesa ocupada de gente para comer uma rabanada, terá questionado, intrigado e surpreso.

O Canadas, comeu rapidamente e nunca uma rabanada de Paiva lhe soube tão amarga. Saiu triste e envergonhado e de tão acompanhado sentiu-se sozinho e desamparado. Já nada era como dantes e as tainadas de outros tempos que viveu na Adega Sporting com os amigos do namoro, já eram apenas uma saudade e desejo que o atormentava no pouco tempo desocupado na Suiça.

Confesso que fiquei com pena do Canadas, ainda por cima com o Tono Henriques a testemunhar tal infortúnio, sorrindo, maroto, por debaixo do bigode branco ainda bordado do grosso tintão.

Já de saída, ainda vi o Canadas a esgueirar-se ligeiro para o carrão e contornar apressado a praça, certamente a jurar para si próprio que para matar estas saudades de petiscada numa adega castiça de paredes de um granito duro, mais vale só que mal acompanhado. - E anda um homem a vir por aí abaixo apressado, a comer quilómetros e a contar horas para vir comer uma rabanada sozinho no meio de uma multidão a torcer o nariz, enfastida! Foda-se!

03.05.24

Olhares

Ribeira de Santa Marinha


a. almeida

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A ribeira de Santa Marinha (ou da Açoreira), nasce na serra do Montemuro, a cerca de 950 metros de altitude, a norte da aldeia de Ervilhais. Tem uma extensão de cerca de 7,50 km. É afluente da margem direita do rio Ardena, este por sua vez é um dos importantes afluentes da margem direita do rio Paiva.
A ribeira de Santa Marinha proporciona vistas e recantos paradisíacos, com bonitas cascatas e açudes, nomeadamente os que envolvem o Parque de Merendas de Nossa Senhora de Lourdes, próximo da igreja matriz de Santa Marinha de Nespereira, freguesião de Cinfães.
Tenho visitado o local em diferentes ocasiões, sendo que é por esta altura que, com água relativamente abundante, e de resto até choveu ontem, mostra a plenitude das suas características.
Sem dúvida a merecer uma visita a quem por perto ande.

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17.02.24

Trilho PR13 - Na senda do Paivô - Revisita


a. almeida

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Segunda visita ao trilho do PR13 "Na Senda do Paivô", um dos vários em território de Arouca. Ponto de partida na aldeia de Regoufe, encastelada na encosta sul dos montes onde noutros tempos a extracção de volfrâmio deu uma vida inusitada a esse local ermo. Terminada a Guerra, o minério deixou de ter o interesse, abandonaram-se as galerias e as máquinas e a aldeia voltou à sua pacatez de antanho, aos campos e aos rebanhos.

O complexo mineiro à entrada da aldeia, noutros tempos de paredes de branco caiadas, são agora esqueletos graníticos cinzentos, abandonados, apenas como figurantes de fotografias dos muitos forasteiros que à procura de aventura ou para matar curiosidades ou encaminhados por roteiros, ali vão parar de olhos no chão na esperança de encontrarem um resto do pesado e negro minério.

Lá em baixo, débeis pelo estio, correm os ribeiros da Várzea e da Sardeira, dando de beber aos verdes milheirais, para logo abaixo, perto do caminho que conduz a Drave, se unirem para dar lugar à ribeira de Regoufe, que por sua vez lá mais para baixo se encontra com as águas mais impetuosas do Paivô, que já traz as águas frias do rio de Frades.

O trilho segue quase todo definido por pesadas lajes de granito ali arrumadas por mãos e braços fortes de gente valente. Praticamente em plano e descida, chega-se à bonita aldeia de Covêlo de Paivô, uma espécie de irmã de sorte e destino de Regoufe, mais fresca, porque a uma menor altitude e banhada pelo Paivô.

Junto à ponte da estrada que conduz a Rio de Frades, Bouceguedim e Ponte de Telhe, oferece-nos, ao lado de um velho moinho em ruína, um local aprazível de águas cantantes, convidando à merenda antes de pôr os pés ao caminho de volta, que ao contrário da vinda, há-de agora ser em subida e por isso bem mais duro o regresso até porque o "forno" já aqueceu mais uns graus. Felizmente, dois ribeiros generosos da margem direita da ribeira de Regoufe resistem ao calor do Verão e dão as suas águas límpidas e frescas às bocas sequiosas.

Já em Regoufe, espera-nos o restaurante "O Mineiro" e a simpatia e simplicidade da proprietária, que dividindo a azâfama entre as suas cabras e as suas hortas e o restaurante, anda numa roda viva mas no final encontra uns minutos para alguns dedos de conversa. Poucos o percebem, e da "cidade" muitos nela apenas veem uma camponesa vigorosa e simpática, a quem fazem perguntas inocentes, mas esta professora aposentada é pessoa de cultura e de boas relações e amiga de políticos e nomes grandes do concelho.

Creio que com esta foi a terceira vez que ali retemperamos forças do desgaste dos trilhos e já está à vista uma próxima, depois de mais um trilho marcado para aqueles montes tão imponentes quanto inclinados. Havemos de descer ao Paiva, calcorrear Janarde, Meitriz, Deilão e Fragoselas, entre outros locais encrustados naquelas encostas.

Abaixo alguns dos muitos olhares.

 

[Junho de 2021]

 

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