Sem perceber o verdadeiro alcance da questão, um visitante, no contexto de um anterior artigo relacionado com J. Rentes de Carvalho, que leio e aprecio, e que, por isso, tenho-o como "grande escritor", perguntava-me, nos comentários, o que era para mim "um grande escritor".
A resposta adequada dependeria sempre do propósito da pergunta, porque esta poderia ter implícita alguma ironia, crítica, contradição, etc. Poderia ser uma pergunta introspectiva ou meramente inocente. Por isso, mereceria uma longa e explicativa resposta ou apenas um gracejo curto e grosso.
Em todo o caso, e em sentido geral, parece-me que classificar um autor como "grande escritor" pode significar várias coisas, dependendo do contexto e dos critérios utilizados. Essa expressão carrega uma dimensão subjectiva e, ao mesmo tempo, associa-se a certos padrões amplamente reconhecidos. A seguir, algumas interpretações possíveis:
Qualidade Literária
Um "grande escritor" é frequentemente associado à excelência na qualidade da escrita: estilo sofisticado, originalidade, criatividade e habilidade técnica no uso da linguagem, conseguindo transmitir ideias, emoções e histórias de maneira cativante e inovadora, mostrando um domínio do ofício.
Impacto Cultural
Um escritor pode ser considerado "grande" pela sua influência duradoura na cultura, moldando a literatura ou a sociedade de forma significativa.
Os seus trabalhos, as suas obras, frequentemente transcendem gerações, sendo lidos, discutidos e adaptados em contextos variados.
Profundidade Temática
Um grande escritor é, muitas vezes, aquele que aborda questões humanas, sociais, políticas ou filosóficas de maneira profunda e universal.
Pode iluminar aspectos da condição humana que ressoam em diferentes épocas e culturas.
Reconhecimento Crítico e Popular
A obtenção de prémios, aclamação recorrente da crítica e impacto na academia literária podem contribuir para classificar alguém como "grande escritor".
Entretanto, também se reconhecem escritores cujas obras, em diferentes tempos, lugares e contextos, atingiram grandes públicos e se tornaram clássicos populares.
Inovação e Originalidade
Um grande escritor pode ser aquele que desafia convenções literárias, introduzindo novas formas, estilos ou géneros que revolucionam a literatura.
LIgação com os Leitores
A capacidade de criar personagens memoráveis e histórias que ressoam emocionalmente com os leitores é uma característica marcante.
Mesmo escritores que não seguem convenções podem ser considerados grandes pela forma como cativam os seus leitores.
Legado
O tempo é frequentemente um critério decisivo: um grande escritor é aquele cuja obra permanece relevante e admirada mesmo após a sua morte. Não nos faltam exemplos a nível mundial e mesmo em Portugal.
Em resumo, chamar alguém de "grande escritor" é, muitas vezes, reconhecer uma combinação de habilidade técnica, profundidade temática, impacto cultural e legado duradouro. A subjectividade está sempre presente, pois os critérios podem variar entre leitores, culturas e períodos históricos.
Não obstante, o que é, para muitos, um "grande escritor" para muitos outros nada diz. Por exemplo, mesmo tendo sido reconhecido com o Nobel da Literatura, não consigo ler nem apreciar a obra de Saramago. E mais exemplos poderia citar.
Em suma, um grande escritor é, sobretudo, aquele que nos diz algo da forma como melhor o sentimos. Neste sentido, e independentemente do que possam dizer os entendidos e analisar os críticos, repetindo-me, tenho como "grande escritor" J. Rentes de Carvalho. Uma folha com uma sua crónica ou um curto apontamento de diário diz-me mais do que um calhamaço de Rodrigues dos Santos.
Sei que ainda é desconhecido, não faz parte dos círculos dos experts, nem é de esquerda, o que não o ajuda no nosso meio, mas basta-me que seja o que é, sem tirar nem pôr.