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Diário de quem já não vai para novo

...e sem paciência para seguir o rebanho.

Diário de quem já não vai para novo

...e sem paciência para seguir o rebanho.

18.03.25

Na poça do ridículo


a. almeida

A coisa está tão vulgarizada que a atitude mais sensata – e menos propensa a futuros arrependimentos ou quedas estrondosas na poça do ridículo – será andar mudo e estar calado, levando a vidinha pessoal da forma mais discreta possível. Redes sociais? Só mesmo para trivialidades ou assuntos que nada tenham a ver com a nossa vida.

Como as coisas estão, vê-se de tudo: juras públicas de amor eterno, beijos apaixonados, abraços e outros mimos, viagens, festanças, tudo a dois, tudo como num conto de fadas – com duendes, unicórnios e filtros do Instagram. Semanas depois, lá se foi o amor, instala-se o ridículo e segue-se a próxima sequela, sempre com o mesmo enredo.

Uniões à prova de bala, casamentos de sonho, baptizados principescos, festanças glamorosas nas quintas mais caras, luas de mel em destinos paradisíacos – e, poucos meses depois, mesmo com os filhos ainda a usarem fraldas, lá vem a separação e, inevitavelmente, mais um episódio do mesmo filme. E isto tanto para os mais anónimos cidadãos como para figuras ditas públicas e com tempo de antena em tudo quanto é televisão e revista cor-de-rosa. Ao ridículo não escapa ninguém.

Isto, claro, é fruto da época e do que a casa gasta. E porque todos temos telhados de vidro, já não há quem esteja a salvo destes modernos fenómenos sociais, onde valores como responsabilidade, paciência, tolerância, respeito, fidelidade, simplicidade, recato e ponderação, andam pela lama da rua e valem tanto como um pataco furado. O mal é mesmo geral.
Apesar de tudo, faça-se um esforço, ao menos que se mantenha a noção do ridículo, porque, perdida essa, então a coisa bate mesmo no fundo – e talvez seja preciso chamar um mineiro para afundar ainda mais o poço.

Mas convenhamos: há muito que o pessoal, sobretudo os mais novos, deixou de seguir conselhos e aprender com as quedas e cabeçadas. Mas não há volta a dar. Estão condenados a cair repetidamente no mesmo ridículo, até que ninguém já os leve a sério – além de um desinteressado encolher de ombros e uma frase solta do género:– Outra vez? Esta gente não se manca?

05.03.25

2+2=22


a. almeida

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Há dias, precisamente em 15 de Fevereiro de 2025, num grupo público de Facebook sobre o concelho de Santa Maria da Feira, alguém partilhou uma publicação de 15 de Fevereiro de 2017, em que era feita referência aos 34 anos sobre a data em que nesse concelho, e certamente noutros, caiu um forte nevão, coisa que, não sendo invulgar naquela região, é rara.

Apesar disso, e da clara ou escarrapachada referência da notícia datada de 2017, por isso perfeitamente compreensível a indicação dos 34 anos, algumas pessoas vieram logo rectificar que não foi há 34, mas sim há 42 anos. Apesar de a autora da partilha da publicação de 2017 ter vindo a explicar e justificar, chamando a atenção para a data da notícia, continuaram os comentários a fazer o reparo como se as explicações tivessem caído em saco roto.

Ou seja, de um modo geral, mas também e sobretudo pelo Facebook, as pessoas não sabem ler nem interpretar e, por conseguinte, leem e interpretam apenas o que querem. Ora, alguém pretender justificar e esclarecer essa gente, é chover no molhado e perda de tempo, porque, para muitos e muitas, 2+2 não são 4, mas 22.

É isso e o acreditar piamente em tudo quanto se publica, tomando como verdades e coisas sérias, autênticas trapaças e contos do vigário. Basta que o assunto pareça coisa fundamentada e até meta criancinhas e adolescentes, supostamente desaparecidos, para se dar crédito e alinhar na replicação, vezes sem fim, servindo na perfeição o isco lançado pelos autores.

Enfim, cada vez mais, cada vez menos critério e escrutínio. Não paramos para analisar, escrutinar e reflectir. Ora, esta situação, já num contexto de banalização da IA – Inteligência Artificial, tende a agravar-se, porque, num repente, a ordem geral das coisas, do conhecimento e da informação fidedigna é subvertida e facilmente comemos gato por lebre e, gulosos, repetimos a dose.

Tempos fantásticos estes, com todas estas potencialidades, mas, simultaneamente, estranhos e perigosos e com pasto para arder à fartzana.

Mas, tal como à autora da atrás referida partilha, é tempo perdido pretender esclarecer, justificar e argumentar, porque a capacidade de ver para além do que aparenta ser, é coisa difícil. Eu próprio já tenho tentado fazer reparos e chamar a atenção em certas publicações nitidamente enganosas e sensacionalistas, mas tem sido tempo perdido e os que facilmente alinham nestas trapaças, continuam a ser fiéis consumidores e seguidores.

É o que é!

[foto: Arquivo da Biblioteca  Municipal de Santa Maria da Feira]

31.01.25

Moralismo canhoto


a. almeida

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Junte-se a questão e os contornos do despedimento das funcionárias mamãs, pelo Bloco de Esquerda, e aquele ar de moralista da sonsinha da Mortágua fica ainda mais  fofinho. Isto de se pretender ser moralista quando se tem telhados de vidro ou se prega como o frei Tomás, dá nisto. 

Lá se vai a reserva de moral do BE, que, recorde-se, já havia levado um rombo com o tal de Robles. Se alguém tinha dúvidas que isto de partidos e políticos é tudo farinha do mesmo saco, ficará mais esclarecido.

09.12.24

Sobre estas capas, fecho-me em copas


a. almeida

Deve ser da época. Na minha página Facebook, é exibida descaradamente publicidade da Worten, a sugerir coisas engraçadas como uma "capa peniana". Deduzo que seja para proteger os pepinos da geada que por cá, finalmente, se fez sentir e que dizem que vai assentar praça pelo menos durante esta semana.

Curioso, acedi ao link e  Worten exibe um aviso a informar que "esta categoria contém produtos exclusivos para adultos. Ou seja, o pudor que tem a Worten não o teve o Facebook.

Bem, como já não sou rapaz a ir para novo, já vi de tudo e mais alguma coisa mas estou a descobrir que neste reino da idiotice o poço não tem fundo. A imaginação humana é mesmo imaginativa. 

Já agora, a contrapor à "capa", ou a complementar, também a oferta de um "soutien de mulher". Deve ser para não haver confusões com "soutien de homem", que também deve ser uma coisa muito usada.

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03.12.24

Olha eu aqui, olha eu ali!


a. almeida

Compreendo! Claro que compreendo, e eu próprio poderia ser tentado a fazer o mesmo! No entanto, com algum distanciamento e uma boa dose de discrição, certas manifestações de culto ao ego parecem-me, pelo menos, exageradas, quando não ridículas.

Refiro-me, em geral, a todos, mas sobretudo a figuras que exercem chefias ou ocupam cargos, nomeadamente no poder autárquico, nas nossas câmaras municipais e juntas de freguesia, que, por qualquer motivo – seja relevante ou insignificante –, fazem questão de se fotografar e expor nas redes sociais.

"Olhem eu aqui, a fazer isto!"
"Olhem eu ali, a fazer aquilo!"
"Olhem eu acolá, a fazer mais do mesmo!"
"Olhem eu aqui, com o senhor doutor!"
"Olhem eu ali, com a senhora engenheira!"
"Olhem eu acolá, a distribuir beijinhos às criancinhas e abraços aos velhinhos!"

Percebe-se o motivo, o de mostrar que mexemos, que somos activos, preocupados e interessados mas, no fim das contas, importa-nos que essa exposição resulte em popularidade, notoriedade e depois em ganhos, seja lá o que isso for, nomeadamente se em situação de eleições.

Tudo quanto seja feito com moderação e no contexto adequado, é compreensível e pode ser relevado e mesmo apreciado. O problema surge quando há excesso e banalização. Esse exagero, além de repetitivo e cansativo, pode gerar o efeito oposto ao desejado, o de soar a falso, a petulância e afastar em vez de criar empatia.

Bom senso e caldos de galinha certamente que são recomendáveis.

12.11.24

Vale de lágrimas


a. almeida

Há bocado, bocadinho, vi pela rede social Facebook alguém que partilhou uma fotografia de uma filha, criança, desconsolada, lavada de lágrimas, a pretexto de nada de significativo, mas tão somente porque na noite deste Domingo o seu clube perdeu com a equipa rival por 4-1.
Nada de mais e de resto vitórias sobre o mesmo clube, com igual ou maior expressão têm acontecido e nestas coisas do jogo da bola bem sabemos (excepto os fanáticos com défice de lucidez) que uma moeda tem sempre duas faces. Além do mais há o ditado que “cá se fazem, cá se pagam” ou o “tudo o que sobe, desce” e outras lições mais, incluindo a oriental do karma.

Importará, pois, fazer ver, e mesmo ensinar, e sobretudo aos mais pequeninos, que o futebol e os seus protagonistas não merecem tanto desconsolo. É apenas uma insignificância muito, muito relativa. Se pudermos ficar fora desta dependência que tolhe as emoções e a lucidez, tanto melhor.

Aos meus filhos nunca impus ou influenciei qualquer seguimento pelo clube de que sou simpatizante. Nem de pequenos, nem de grandes. Fazer-lhes isso seria condicionar a sua liberdade, tanto numa fase da idade em que não têm percepção dela, ou mesmo quando já são detentores de escrutínio e escolha própria.

Mas há, e no geral, quem teime nesta forma de moldar os gostos e as preferências dos nossos e dos outros. Assim, não raro, desde pequeninos é ve-los a vestir, aos filhos ou afilhados, camisolinhas com as cores dos clubes, chapéus, cachecois, jogos, brinquedos, levá-los aos jogos, etc. num doutrinamento que se critica a entidades, estados ou governos.

Em suma, nada justifica que uma criança chore ou se entristeça pelo seu clube, o clube que os seus determinaram que fosse. Diz isto, sem moralismos, um benfiquista que gosta do seu clube, que também tem a paixão na justa medida, mas que, no caso do jogo em questão, só soube do resultado na manhã do dia seguinte, tendo ido dormir despreocupado e com a segura certeza de que o que for há-de ser. De todos os jogos do clube até ao momento realizados, terei visto uma 10 minutos de resumos, se tanto.

Para além de tudo, o futebol profissional, aquilo é gente que vive e ganha como príncipes e que não justificam que por eles ou pela sua entidade patronal se perca uma lágrima sequer, quanto mais um vale de lágrimas a ponto de nos estragar o dia ou noite.

Há, pois, coisas bem mais importantes, muito mais, e quem não for capaz de relativizar e ordenar a ordem dos seus valores, não andará no caminho certo. Dirão que paixão é isso, que é fervor, e mais uma catrefada de lugares comuns, mas no final das contas tudo não passa de um saco de argumentos que vale zero, apenas com aquelas coisas que dizemos e ouvimos só para nos convencermos a nós próprios.

Haja bom senso e um relativismo saudável!

08.11.24

Nem todos somos osórios


a. almeida

Não sou leitor nem ouvinte regular do Luís Osório no seu “Postal do dia”. De quando em vez, sim.

Quase sempre concordo e aprecio, mas nem sempre. No fundo é muito previsível no que escreve e “politicamente correcto” quanto baste. Procura não ferir susceptibilidades porque sabe que neste mundo-cão das redes sociais os julgamentos são fáceis e alvos de artilharia de quem não se conhece e a ser disparada de todos os lados. Basta uma palavra mal colocada, uma apreciação sinuosa fora da linha recta, a ponta do pé fora da argola, para aqueles centos de habituais comentários positivos, alguns untuosamente elogiosos, se transformarem nas mais duras “facadas” com apreciações mais ou menos ofensivas.

O Luís Osório sabe isso melhor que ninguém e por isso vai dizendo e escrevendo num estilo que agrada à larga maioria, quase sempre não deixando ponta sem nó e para cada palavra mais contundente logo coloca por baixo uma almofada, se uma ideia desalinha do molde logo a suaviza no parágrafo seguinte. No fundo como a experiente enfermeira a acariciar o músculo antes de lhe espetar a agulha.

Lançou agora o Luís Osório um livro, um calhamaço de 376 páginas, composto por muitos desses postais que considera intemporais e que por isso tanto podem ser lidos hoje como daqui a anos porque sempre actualizados no que pretendem transmitir, justifica. Concordo, nem poderia ser diferente. Está já nos melhores escaparates.

Apesar da apreciação acima, não quero com ela julgar o Luís Osório, mas antes expressar uma pontinha de inveja por não sermos todos osórios, não tanto pela qualidade do que escreve, que me é superior, mas por não ter eu, nem centenas ou milhares de osórios neste pobre país, o palco necessário à divulgação da escrita e da sua publicação. Nem presidentes da república a prefaciar. Não é para todos, seguramente para um qualquer Zé da Esquina por mais bem que escreva,

De resto, mesmo que num mercado à nossa medida, pequeno, atrofiado, há ainda muitos osórios com boa plateia, amplos palcos e tempos de antena onde podem vender facilmente o produto, porque as editoras os conhecem. São chamados como ilustres convidados às rádios, às televisões, aos jornais e revistas, numa promoção gratuita. Tudo é fácil e invariavelmente o que escrevem vender-se-á na primeira e segunda fornadas como pãezinhos quentes já com manteiga.

Já tive umas coisitas escritas para dar livro e algumas editoras até se interessaram e dispostas a fazer contrato, com as coisas a serem feitas como com a gente graúda da escrita, mas no essencial vai sempre dar ao mesmo, em que logo à cabeça o escritor anónimo, ilustre desconhecido do meio, tem que comprar à sua conta uma quantidade tal de exemplares que logo paga os custos da publicação e ainda o lucro suficiente para a generosa editora. O resto, do pouco que se vender, ainda será lucro para quem editou e apenas uns trocos para quem escreve. Será de supor que depois dessa primeira fornada, o livro que daí resultou sai dos escaparates, se lá tiver chegado, e arrumado da prateleira de baixo para desocupar espaço. Assim, dessa primeira ilusão, a coisa passa rapidamente ao esquecimento e o autor, continuamente anónimo a tentar vender a amigos e a familiares a porrada de livros que teve de adquirir para não ficar com o prejuízo todo. E nem todos são Sócrates com amigos reconhecidos a garantir a compra da edição. É mais ou menos assim, porque já estive no limiar desse processo e porque o diz quem melhor sabe do meio.

Assim sendo, esta coisa de arrumar as ideias em escrita ainda vai compensando mas sobretudo para os osórios e outros que beneficiam dos palcos já montados, dos padrinhos já conhecidos. Certamente que alguns tiveram que escalar até aí chegar, mas no geral basta desfraldar a vela porque o mar está de feição e o vento sopra para o lado certo.