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Diário de quem já não vai para novo

...porque as palavras são a voz da alma.

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05.09.24

Aldeia da Pena


a. almeida

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Aldeia da Pena, freguesia de Covas do Rio, concelho de S. Pedro do Sul.

Uma aldeia de xisto onde dizem que regularmente apenas vivem sete pessoas. Uma jóia perdida e à qual não é fácil chegar. Basta pensar que, vindos de Arouca, tem que se passar pelo Portal do Inferno e contornar penedos e escarpas. Mas vale a pena o esforço, as vertigens e as mãos suadas pelo “cagufe”, para quem ali quiser comer, cabrito ou vitela, um ambiente rústico à sombra do xisto e da ramada de videiras. Nem sempre a coisa corre bem, como já me aconteceu, porque a conta demasiado alta para um bife deixado torrar, mas em regra não corre mal.

Claro está que uma vez chegados ali, é bem possível que se tenha já visitado Rio de Frades ou Regoufe, por onde em tempos de guerra as montanhas foram esventradas em procura do minério volfrâmio. Outras histórias...

Certamente, porque próximo, que não se deixa de subir ao altaneiro monte de S. Macário (mesmo que abadalhocado com antenas) e de regresso por várias outras aldeias típicas, mesmo que não à mítica e misteriosa Drave que só por si merece um dia e não é de pópó que lá se chega, todas encastradas nas encostas da Freita e da Arada, serras tão bonitas e imponentes que não desmerecem de Estrelas e Marões, como Covas do Monte, Covas do Rio, Fujaco, Gourim, etc.

Mas quem for gente de praia, de planinhos e de paisagens urbanas, por favor, não vá!

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01.09.24

Crónicas breves de viagens curtas - 2


a. almeida

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Quem já leu e (como eu) releu o “As cidades e as serras”, de Eça de Queiróz, sabe do que falo e do que o trecho a seguir se refere. Relembrando, a descrição do caminho da personagem Jacinto, que vindo do ninho da civilização expressa no seu áureo ponto na cidade das luzes, Paris, decide rumar à austera e velha Quinta de Tormes, um lugar imaginário mas que se refere à Quinta de Vila Nova, localizada por terras de Santa Cruz do Douro – Baião.

Descarregado na estação de comboio em Aregos, na borda do Douro, inicia o caminho sinuoso e íngreme com uma extensão de aproximadamente 4 km, por entre casario e vegetação, e o homem sedentário de Paris, rodeado de todo o conforto civilizacional de que dispunha à época, entra agora num mundo natural, puro, agreste, quase primordial, onde a natureza e a forma de viver simples mostram que a ligação ao homem contém ainda todo esse enraizamento. E nessa simplicidade, que o destino se encarregou de endurecer, perceberá, como irrefutável, a presença dos símbolos de abundância e da vida saudável associada à vida rural.

Nesta pausa estival, fui, também, percorrer esse mítico e real caminho e mesmo que o grande escritor por ali pouco tempo tivesse estado, porque cedo morreu, foi com ele o sonho de transformar a velha casa no seu derradeiro aconchego maternal, que literalmente nunca teve.
Felizmente, a sua filha e a descendência desta, até também se extinguir, conseguiram mitigar esse sonho, transformando a antiga Quinta de Vila Nova, que a ficção transformou numa nova realidade, a Casa de Tormes, num lugar de evocação do escritor. Sem descendência, o legado que engloba a quinta, a casa e muitos objectos pessoais dessa grande figura da nossa melhor literatura, que vieram de Paris depois da sua morte, foi deixado a uma fundação com o nome do autor de Os Maias (1888), O Crime do Padre Amaro (1876), O Primo Basílio (1878), A Capital (1877), entre outros, e criada para o efeito.

Assim tive a oportunidade de visitar a casa, o espaço e tocar em objectos que o escritor usou no seu dia a dia de diplomata e escritor.
Uma rica experiência, a que se juntaram outras e numa prova provada que importará sempre que um simples passeio ou singela estadia tenha um sentido complementar de enriquecimento de cultura e história.

Claro está que as tendências e os gostos modernos não se compadecem com estas “minudências” e de tão atrofiantes essas generalidades, acabam por criar nos outros, poucos, uma sensação de anacronismo, até de um deslocamento no tempo e espaço.
Mas que seja! De resto sempre houve e haverá lugar para tudo e todos, além de que um balão sempre subirá mesmo que cheio de nada, tão somente de ar quente.

Seguem os extractos desse trecho de “As cidades e as serras”:

“E não tardaram a aparecer no córrego, para nos levarem a Tormes, uma égua ruça, um jumento com albarda, um rapaz e um podengo. […] E começamos a trepar o caminho, que não se alisara nem se desbravara […] logo depois de atravessarmos um a trémula ponte de pau, sobre um riacho quebrado por pedregulhos. […] E em breve os nossos males esqueceram ante a incomparável beleza daquela serra bendita!” “Jacinto adiante, na sua égua ruça, murmurava: - Que beleza! E eu atrás, no burro de Sancho, murmurava: - Que beleza! Frescos ramos roçavam os nossos ombros com familiaridade e carinho. Por trás das sebes, carregadas de amoras, as macieiras, estendidas ofereciam as suas maçãs verdes, porque as não tinham maduras. […]

Muito tempo um melro nos seguimento, de azinheiro a olmo, assobiando os nossos louvores. Obrigado, irmão melro! Ramos de macieira, obrigado! Aqui vimos, aqui vimos! E sempre contigo fiquemos, serra tão acolhedora, serra de fartura e de paz, serra bendita entre as serras! Assim, vagarosamente e maravilhados, chegamos àquela avenida de faias."

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28.08.24

Crónicas breves de viagens curtas - 1


a. almeida

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A minha carteira não tem fundo tal que permita empreender jornadas de férias espampanantes, daquelas que a malta não perde a oportunidade para se enquadrar com panos de fundo mais ou menos típicos que ninguém desperdiça para marcar o ponto, seja com a férrea torre Eiffel, com os vetustos palácios de Buckingham, Real d'O Pardo, os antigos e clássicos Partenon ou Coliseu, mais exoticamente com as pirâmides de Gizé ou numa sintonia espiritual com as grandes catedrais góticas de Notre-Dame, Colónia, Sevilha ou a estapafúrdia criação de Gaudi na Sagrada Família. A lista desses lugares circundados por um turismo de massas é extensa, tanto na velha Europa como noutras latitudes, aquém e além mares.

Mas tivesse eu tal carteira e creio que mesmo assim, a pouco paciência que a idade nos retira para enfrentar um emaranhado de procedimentos burocráticos, movimentos aeroportuários, cargas e descargas, check-ins e ckeck-outs, seria mais que suficiente para refrear ânimos e amolecer vontades.

Posto isto, sempre assim foi e continuará a ser, cada um fará o que melhor lhe aprouver e mesmo que em rigor não possa, para isso é que existem créditos na Banca e de pouco importa fazer contas às contas porque o futuro é já amanhã. O senhorio que aguente os cavalos, as operadores podem esperar mais uns dias, o mecânico umas semanas e para a dentista, é mais dente menos dente. Férias à Lagardere é que não se dispensam.

Assim, de perna curta e carteira apertada, vamos saltando aqui e ali e em vez de uma Notre-Dame abeirámo-nos de um Mosteiro de Santo André de Ancede, em vez de gondolar pelos canais de Veneza moliçamos pelos de Aveiro, no lugar da conservadora Tower Bridge atravessamos a elegamte de Mosteirô e em vez de ouvir as horas pelo Big-Ben, o relógio da estação de Aregos também tem horas certas.

Mas uma saída, para não lhe chamar indevidamente viagem, mesmo que mais ao perto que ao largo, é sempre mais que as coisas que se veem, a gastronomia que nos vem ao prato e a maciez da cama onde se repousa. É mais, muito mais que isso, mas já quanto à sensibilidade para o Zé da Esquina ser capaz de ler essas entrelinhas, a coisa pia mais fino e até a espiritualidade de um fino fresco por fora e por dentro, ali a saciar na esplanada rodeada de Douto contido em margens altas de verde, é melhor nem falar porque pior cego é o que não quer ver.

Numa dessas entrelinhas, num excelente restaurante, com vista para uma boa nesga de Douro, com um bom ambiente onde não há televisão a passar Gouchas e trouxas, nem a música da Rádio Festival, a afável menina fez-nos sentir como se num chique restaurante de Paris, mas queixava-se, a prevenir, que o serviço poderia atrasar um pouco porque para além do chef, só mesmo ela para todo o resto do serviço e ainda um balcão de café. Como fomos dos primeiros, o serviço foi rápido e como era casa com licença certificada para a oferta de vitela arouquesa, a coisa correu bem, deliciosamente e com um custo justo e adequado. No final, a acompanhar a generosa gorjeta, a promessa de voltar num dia destes quando os bombeiros estiverem sossegados nos quarteis e as cores dos avisos meteorológicos andarem pintados de verde.

Mas então ia eu deixar de saber o porquê de apenas uma funcionária para tanto serviço e clientela bastante e requintada numa altura destas que a malta diz de época alta? Explicou-se que de facto por ali não conseguem arranjar alguém que queira trabalhar, mesmo a tempo inteiro, nem sequer brasileiros ou marroquinos porque esses, vá lá saber-se por que razões, gostam é do litoral. Além do mais, mesmo de três ou quatro colaboradores habituais, todos se escusaram a trabalhar nesta altura, recusando os encarecidos pedidos, mesmo que com a devida antecedência e remuneração compatíveis
Mas os dados estatísticos e o senhor INE dizem que o desemprego está a aumentar e que os jovens, coitados, não conseguem emprego.

O INE não quer saber as razões no terreno e apenas interpreta números e ignora que muitos dos que estão nas listas do desemprego, na realidade não querem trabalhar, muito menos em serviços que sabemos que têm horas muito específicas. Assim, vamos fazendo de conta que não há empresas a precisar de funcionários, seja nesta área da restauração e turismo seja a trolhas ou pedreiros. Na realidade, emprego talvez procurem mas não trabalho. Não trabalhar parece que é mais rendoso e quando o Governo diz que vai fazer com que ninguém no desemprego ganhe mais que empregado, aqui del-rei que é uma injustiça!

Ainda hoje, já de regresso, no parque de estacionamento de uma média superfície comercial cá da zona, um jovem casal, com cores de gente de outras latitudes, andava a abordar os clientes na pedinchice e usando uma bebé como isco. Ambos jovens, com bons corpos, qualquer um deles capaz de ser trolha, pedreiro ou servente de mesa ou ajudante de cozinha, mas nada. São bem mais rentáveis estes expedientes e ficamos sempre sem saber se estão por cá de forma legal e se orientados pelas autoridades e se fazem parte ou não das estatísticas que dizem que há desemprego.

Por mim, batam-me à porta e, intermediando, amanhã mesmo arranjarei trabalho para vários trolhas e pedreiros, bem como poderei dar o contacto do tal restaurante que não consegue gente para servir, fritar batatas ou limpar louça, tachos e panelas. Mas não digam nada ao INE, para não lhes baralhar as contas.

29.05.24

Rio de Onor - A merecer amor


a. almeida

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Num fim de semana com tempo propício a dar à sola, uma saída pelo extremo nordeste transmontano. Dos locais que merecem passagem obrigatória, uma visita a Rio de Onor, eleita em 2017 num concurso manhoso como uma das 7 maravilhas das aldeias portugueses (aldeias em áreas protegidas), situada em pleno Parque Natural de Montesinho, no concelho de Bragança, mesmo no limite da raia, e, porque à beirinha e em continuidade, também um olhar à espanhola Rhionor de Castilla e cujas populações convivem irmanadas como se fossem uma única aldeia.

Aldeia de montanha, formada de casas típicas serranas onde predominam o xisto e a madeira como materiais de construção, com varandas alpendradas a que se acedem por escadas exteriores, e ladeadas pelo límpido rio com nome de Onor, do lado português, e del Fontano, do lado espanhol, que enquadram a paisagem, marcada pela igreja matriz de S. João Baptista, sem torre mas com campanário de dois sinos, como é típico por esta região transmontana.

Ambas as margens do rio são unidas por várias passagens, como a emblemática ponte de origem romana. Do lado de Espanha, a singular travessia por poldras (conjunto de pedras alinhadas, cada uma à distância de um passo).

Dizem os guias turísticos que é uma aldeia de coração comunitário e que tem nos seus habitantes o melhor património, com genuíno saber receber.

Talvez porque com a expectativa em alta, porque quem visita Rio de Onor apenas fotografa as coisas pitorescas, floridas e bem arranjadas, sobretudo o casario à face da ruela que margina o rio pelo lado esquerdo, confesso que fiquei desapontado. Esperava uma aldeia mais homogénea na sua estrutura e sobretudo bem limpa e arranjada, já que é nitidamente um local visitado. Do lado espanhol, mesmo que também com casario em ruínas e a igreja de Santa Martina desmazelada e ressequida pelo sol, vi mais asseio e limpeza das ruelas.

Mas vi, naturalmente, do lado português coisas bonitas, mas sobretudo muitas casas em ruína, a ameaçarem cair sobre quem passa nas rua, a merecerem melhor sorte e com reconstrução condizente à tipologia de materiais e tradição, o que não vi de todo na maior parte das reconstruções, algumas autênticas aberrações. Vi algumas dessas ruínas à venda, mas acredito que com valores desfazados da realidade. O local é bonito, com algum valor turístico, mas em rigor daquelas ruínas pouco ou nada se aproveita numa reconstrução, para além do modelo e tipologia a seguir e respeitar. Ora os vendedores e imobiliárias nestas casos têm a tentação de vender um monte de pedras como se ouro seja.

Fica a ideia que por ali, apesar da natureza da aldeia e da sua integração no Parque Natural de Montesinho, cada um constrói e reconstrói como bem lhe apetece. E do que se vê reconstruído, invariavelmente relacionado ao turismo, nomeadamente com casas de alojamento. A comprovar esta falta de gosto, até a vista frontal da bonita igreja matriz é perturbada por vários grossos e negros cabos da rede eléctrica. Que raio de gente esta que manda nestas coisas, a ponto de não serem capazes de encontrar uma solução que desvie os cabos da vista?

Merecia, de facto, uma maior atenção dos responsáveis. Ainda muito falta fazer por ali, mas também, convenhamos, quem é que se preocupa com uma aldeia isolada ali na extrema de um país que pouco ou nada valoriza o seu interior e sobretudo o mais profundo?

O caminho que falta percorrer nesse sentido de valorização e requalificação ainda é longo e sinuoso como a estrada que liga a Bragança, que dizem que parte dela só a partir de década de 1960, pelo que pelo menos uns 30 quilómetros até à aldeia eram percorridos apenas por trilhos e caminhos no que acentuava o seu isolamento face a povoados próximos, sobretudo à sede do concelho.

Rio de Onor, seja como for, a merecer visita, mas sobretudo amor.

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03.05.24

Olhares

Ribeira de Santa Marinha


a. almeida

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A ribeira de Santa Marinha (ou da Açoreira), nasce na serra do Montemuro, a cerca de 950 metros de altitude, a norte da aldeia de Ervilhais. Tem uma extensão de cerca de 7,50 km. É afluente da margem direita do rio Ardena, este por sua vez é um dos importantes afluentes da margem direita do rio Paiva.
A ribeira de Santa Marinha proporciona vistas e recantos paradisíacos, com bonitas cascatas e açudes, nomeadamente os que envolvem o Parque de Merendas de Nossa Senhora de Lourdes, próximo da igreja matriz de Santa Marinha de Nespereira, freguesião de Cinfães.
Tenho visitado o local em diferentes ocasiões, sendo que é por esta altura que, com água relativamente abundante, e de resto até choveu ontem, mostra a plenitude das suas características.
Sem dúvida a merecer uma visita a quem por perto ande.

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