06.08.24
No reino do ilusório
a. almeida
Como já não sou rapaz a ir para novo, creio, sem certeza, que já o escrevi por aqui ou em qualquer outro lado, que frequentemente passo os olhos pelos "postais do dia" do Luís Osório e assinaria por baixo muitos deles, mas de outros tantos, nem por isso. De resto, nada demais, pois era só o que faltava que andássemos todos alinhados a marchar de passo certo como naquelas paradas de tropas em países miltares e militarizados.
Do que tenho lido do Luís Osório - LO -, e será só impressão minha, tem escrito muito de elogios e outros panegíricos a certas personalidades, essencialmente figuras mais ou menos públicas, incluindo malta do desporto e a alguns e a algumas que por estes dias andam por Paris, ainda sem grandes feitos, à espera dos saltos do atleta mais português de Cuba, para uma medalha de ouro, mas seguramente ciosos dos seus papéis.
Ora o LO vê e acha virtude em tudo e mais alguma coisa, e até o fracasso, a derrota, o azar ou a falta de sorte, são motivo de bem dizer e de exaltação. Antes dizer bem que mal, até porque bem sabe que pelas redes sociais basta uma frase mais bicuda para se ter à perna a cachorrada dos bons costumes, com as matracas bem abertas e dentes afiados. Por conseguinte, mesmo que sem grandes motivos, uma ensaboadela a mais no lombo ou uma camada de graxa suplementar no sapato, não faz mal algum. E quem não gosta que lhe passem a mão pelo pelo?
Mas, em boa verdade, o Luís Osório sabe que é assim que a coisa funciona, que ganha clientela, porque isto de falar bem e escrever melhor sobre pessoas anónimas, a coisa não resulta porque ninguém as conhece. Logo exaltar os feitos de um pedreiro, de um trolha, de um funcionário que nos recolhe o lixo à porta, do coveiro, do mineiro ou o agricultor, o que nos planta e fornece batatas, cenouras e tomates, é coisa que não conta para o totobola do mediatismo, porque a plateia não sabe se há-de apostar numa vitória ou derrota de caras ou se, pelo sim, pelo não, usar uma dupla ou tripla.
Ora estes anónimos, tantos e bons portugueses, que ajudam este país a andar para a frente, a edificar casas e famílias, com esforço, dedicação, até mesmo com puro altruísmo e exercício cívico e de cidadania, esses não constam nos postais do dia dos osórios, não merecem elogios fáceis de um primeiro-ministro ou de outros governantes nem são recebidos ou medalhados em Belém. Esses não são fotogénicos nem acrescentam valor a quem lhes reconhece valor. Perda de tempo! O país precisa é de malta a correr, a saltar, mais rápido, mais alto, mais forte! Esses sim, é que são o sumo da nação! Vale mais um triplo salto mostrado pela televisão que os milhares de saltos, sobre barreiras e obstáculos que são necessários para o dia-a-dia do povo a levar o país para a frente.
Posto isto, este é um mundo cão, ou gato, onde uns, bem lustrados pela graxa social e institucional, comem e são presenteados com whiskas de primeira qualidade, servidas em gamelas prateadas ou mesmo douradas. Os demais, o grosso da cãozoada do canil, esses passam ao lado e são apenas a massa lubrificante que agiliza a engrenagem, o motor da nação. Mas quem é que quer sujar-se com lubrificantes?