Neste Domingo fui a um casamento. Terei ido ao último talvez há uma boa dúzia de anos. De uma vintena de sobrinhos, chegou a vez da Teresa.
Gostei, sobretudo, da parte mais importante e significativa, a celebração religiosa. Já a poucos e poucas importa, mas é o que é. É certo que com músicas a puxar para a lágrima fácil, e não havia necessidade, mas também é o que é. Ademais, os artistas que estão no mercado da coisa (e foram bons) percebem da poda.
O resto, o acessório, o entretenimento e o comes-e-bebes, saberemos todos, mais ou menos, como a coisa decorre, porque estas modas replicam-se e do mais humilde ao mais abastado, ninguém quer ficar para trás e com mais ou menos esforço, com capacidade própria ou a contar com o "ovo no cu da galinha" dos convidados para pagarem estes o "copo-de-água", e quiçá a lua-de-mel num qualquer paraíso tropical, lá vamos seguindo o que as modas e tendências desta indústria ditam.
Em abono da Teresinha, mesmo que parecendo sofisticada a coisa até foi do mais simples e comedida, porque como em tudo na vida, neste mercado há preços e variantes para todos os gostos e carteiras e em que é dado a comer e beber aos convivas coisas tais que nem durante um mês seria possível comer e beber. Por ali come-se sobretudo com os olhos. Celebra-se a alegria, pois claro, mas sobretudo o esbanjamento, o desperdício, a desproporcionalidade.
Neste contexto da coisa, com celebração marcada para o meio-dia, o programa começou a horas. Na celebração, após o enlace, alguns convivas, pouco dados a estas coisas, e julgando estar numa arena ou campo de futebol, entre palmas discretas soltaram uns gritos e assobios. No final, na despedida, o jovem pároco endereçou os parabéns aos noivos, com votos de felicidades e dando o "recado" de que dali a 25 anos, na celebração das "bodas de prata", esperaria "que a coisa corresse melhor" e com mais algum comedimento e que os convivas mais efusivos tivessem tempo de perceber a diferença entre estar num lugar de culto e contemplação e num campo de futebol ou sala de espectáculos. Tudo no seu lugar e contexto próprios, fica bem.
Importa referir que foi este casamento no dia de S. João e a data não foi a escolhida pelos noivos mas determinada, com quase dois anos de antecedência, pela agenda da Quinta de eventos. É assim que funciona e os noivos, regra geral, quando querem uma coisinha XPTO à sua medida, têm que aguentar os cavalos. Por isso, já pouco conta a agenda do padre, do registo civil ou da disponibilidade de pais e padrinhos.
A entrada na Quinta, a cerca de 40 km da local da celebração, aconteceu já em hora adiantada para o almoço. Assim, com um dia muito quente, os cerca de 150 convivas entraram nas habituais entradas de tudo e mais alguma coisa e bebidas à fartazana. E andou-se nisto até cerca das 18.30 e o almoço passou a jantar.
No entretanto, reparei que as madames, de vestidinhos cingidos com abertura na perna de cima abaixo, decotes generosos e de sapatinhos de cinderela, com tacões altos ou de agulha, depressa os atiraram para canto e andavam por ali ou de chinelas ou de sapatilhas. O que não sofremos para parecer bonitos e elegantes!
Os jovens rapazes, habituados ao conforto das sapatilhas, andavam por ali a coxear já com bolhas nos calcanhares feitas pelos sapatinhos de biqueira afiada, apertados, comprados de véspera. Como já não sou rapaz a ir para novo, e a velhice ainda é um posto, também comprei sapatos novos mas andei a treiná-los um mês antes, pelo que problemas desses não tive. De resto evitei danças, correrias e embarques nos comboios de gente.
Depois as coisas habituais que agora dizem ser fixes, como as fotografias assim e assado, as fotos no "espelho mágico", os joguinhos e outras cenas a mando do disc-jockey, duelos de cadeiras entre homens e mulheres, formação de combóios, as músicas do costume de que não podem faltar o YMCA, o bomba com movimento sexy, o "I Will Survive", o leilão da gravata do noivo, e por aí fora. Saberão do que falo.
E com tudo isso, depois o partir do bolo, que pouco faltou para tombar no lago que o rodeava, os noivos a passar por entre alas de convidados fornecidos com velas de foguete e copos de espumante e, porque era noite de S. João, o lançamento de balões e o habitual fogo de artifício. O evento decorreu perto do Porto pelo que havia ali uma mistura de foguetes e balões. Parecia que havia casamentos em tudo quanto era sítio.
Depois o jantar, dizem que ceia, só já pela meia-noite e com oferta de sardinhas assadas, francesinhas, bifanas e tantas outras coisas que tais. Avisado que aquelas não são horas de encher a pança, já castigada pelo desacerto do horário, achei preferível passar ao lado e dar de frosques. Saí de mansinho pela meia-noite e meia. Mas disseram-me, depois, que houve gente que aguentou até às 4 da matina. Jovens, pois claro. Acredito que no dia seguinte foram ressacas, pés maltratados, caganeiras e indisposições. Talvez por isso, ou pela Teresa ser farmacêutica, na casa de banho havia um "kit da ressaca" com uma carrada de comprimidos tidos como recomendáveis a aliviar os excessos da boca. Coisas!
Em resumo, o que se esperava que fosse porque estas coisas cada vez mais são "dejá-vus", lugares comuns, clichês, mais do mesmo, um "a maria vai com as outras". Mas não podia dizer que não à Teresinha, logo a sobrinha que tenho como mais contida e simples. E não fosse assim e a comidinha teria sido menos tradicional e mais uma palete de invenções estapafúrdicas de chefes armados ao pingarelho. Ainda bem, e aquele bacalhau e posta de novilho estavam divinais, acompanhados por uns grelinhos com migalhas de pão.
Desculpem alguma ironia, mas que vai indo a casamentos sabe que é assim, e nestes modernos tempos é do que a casa mais gasta e os convidados andam todos a toque de caixa, como marionetas nas mãos dos fotógrafos, disc-jockeys, e chefes de cerimónias. Tudo é muito demorado, protocolar, exasperantemente cansativo. Creio, até, que estas coisas fazem-se sem qualquer respeito pelos mais velhos (porventura os que mais prendam os noivos). Tudo é preparado como se todos tivéssemos 20 ou 30 anos. É o que é.
Tenho para mim, não fora a exagerada despesa para o Estado, para todos nós, e a bandidagem devia ser penalizada, não com penas de prisão mas obrigada a participar num casamento moderno todos os dias. Era castigo bastante.